“O que é o Alcorão?”
ما هو القرآن؟
A crítica de um intelectual do Marrocos sobre os ensinos éticos do Alcorão
Por Rev. Bassam M. Madany
No dia 24 de julho de 2009 eu postei neste website um artigo sobre a necessidade de uma nova hermenêutica do Corão (*). Reformistas Muçulmanos consideram esse tópico de suma importância para que o Islã se torne compatível com a idade moderna. De fato, eles têm lutado pelo problema da tahdith (modernização) e tajdid (renovação) pelos dois últimos séculos.
Um dos mais antigos reformadores foi Jamal al-Din al-Afghani (1838-1897). Referindo-se às obras desse reformador, o Professor Albert Hourani da Universidade de Oxford escreveu: “Em seus escritos há uma sensação vívida da grandeza e pequenez da história Islâmica: a gesta Dei no princípio e o longo e melancólico declínio em seguida.”[1]
Al-Afghani deixou diversos discípulos para continuarem seu trabalho, dentre eles estava o Egípcio Muhammad ‘Abduh (1849-1905), seguido por Qasim Amin (1856-1908) e Ali ‘Abd al-Raziq (1888-1966). Eles admiraram o progresso das nações Européias, lutaram contra a ocupação Britânica em seu país e procuraram uma renovação de uma forma vitalizada do Islã que encarasse o crescente desafio do imperialismo Europeu.
No século passado, Taha Hussein, um graduado da Universidade al-Azhar em Cairo, e da Sorbonne em Paris, uniu-se a seus predecessores numa tentativa de promover a reforma. Ele escreveu uma obra crítica sobre a literatura pré-Islâmica, o que o levou a um conflito com as autoridades religiosas do Egito. Classificaram seu trabalho como uma ameaça à integridade e singularidade do Alcorão como autêntica palavra de Allah. Em seu livro, Hussein sinalizou similaridades no vocabulário e estilo do Alcorão com a rica literatura poética Árabe dos dias de “Al-Jahiliyya”, um termo usado pelos historiadores Muçulmanos para os tempos pré-Islâmicos, que literalmente significa “Os Dias de Ignorância”. Os Muçulmanos Ortodoxos insistem que o Alcorão é único, não apenas em sua origem divina, mas também em cada palavra de seu texto. Assim, qualquer um que faça relação de qualquer poesia Árabe dos “Dias de Ignorância”, escritos por algum mero mortal, com seu livro sagrado, comete uma ofensa e é visto como uma ameaça à ortodoxia.
Os ânimos mudaram drasticamente após a Segunda Guerra Mundial. Alguns jovens Muçulmanos, que foram para o exterior para obter educação mais elevada, foram fortemente influenciados pelo Marxismo e por ideologias seculares. Por exemplo, Jalal Sadeq al-Adhm, um membro de uma proeminente família Sunni de Damasco, publicou em 1969 “Naqd al Fikr al-Deeni” (Uma Crítica ao Pensamento Religioso). Diferentemente dos reformadores do século XIX que visavam a modernização do Islã, ele atacou os textos sacros de todas as religiões teístas. Isso marcou o início de um novo gênero de escritos de jovens Muçulmanos que defenderam uma reavaliação radical de suas heranças religiosas e culturais. Al-Adhm teve problemas com as autoridades governamentais de Beirute, no Líbano, que procuraram proibir a publicação de seu livro.[2] Isso sinalizou um aviso a todos candidatos Muçulmanos a intelectuais de que nenhuma crítica ao Alcorão seria permitida ou poderia aparecer em forma impressa. No entanto, tudo mudou com o advento da internet e quase que instantaneamente ela começou a ser usada por intelectuais Árabes. Há diversos websites em idioma Árabe que permitem a publicação de artigos críticos que escapam dos grilhões da censura governamental.
Um exemplo recente de um artigo crítico foi postado em 12 de setembro de 2010 no www.alawan.org. O ensaio com o título “O que é o Alcorão?” ما هو القرآن؟ foi escrito por Sa’eed Nasheed, [3] um intelectual Marroquino e que trata da natureza e autoridade do Alcorão em nossos tempos. Aqui, traduzido do Árabe, alguns excertos de seu ensaio que faz com que pensemos a respeito.
Um dia, me peguei pensando em organizar um forum virtual onde os leitores e colaboradores do www.alawan.org pudessem dialogar sobre a questão, “O que é o Alcorão?” ou, específicamente, “Qual é o benefício ou relevância do Alcorão para os nossos tempos?”
Talvez tal discussão rendesse uma resposta convincente a tal pergunta tão importante.
Ponto 1
Como Muçulmano, enquanto estava no processo de recitar o Alcorão, tive minha primeira dificuldade na Surah 58, Ayah 3, “Al-Mujadilah” que diz:
E aqueles que repudiam suas mulheres com az-zihar, em seguida voltam atrás no que disseram, então, que alforriem um escravo, antes que ambos se toquem. Isso é o com que sois exortados. E Allah, do que fazeis, é Conhecedor. [Tradução de Helmi Nasr]
Pensei comigo mesmo: eu nunca faria isso com minha esposa; então, este Ayah é irrelevante e não tem nada a me ensinar. Eu continuei recitando e parei na Surah 4, Ayah 24, “Al-Nisa”, que diz:
E vos é proibido esposardes as mulheres casadas, exceto as escravas que possuís. É prescrição de Allah para vós. E vos é lícito, além disso, buscardes mulheres com vossas riquezas, para as esposardes, e não para cometerdes adultério. E, àquelas com as quais vos deleitardes, concedei-lhes seu mah como direito preceituado. E não há culpa sobre vós, pelo que acordais, mutuamente, depois do preceituado. Por certo, Allah é Onisciente, Sábio. [Nasr]
Pra falar a verdade, eu nunca fui possuí, nunca fui dono de ninguém, nem em casa e nem no trabalho. Além disso, minha “loucura”[4] não me permite ter mais que uma esposa. Então, esse Ayah não tem nada a me ensinar, pessoalmente; nos dias passados, esse Ayah concedeu as obrigações daqueles homens cujos desejos e fantasias os fizeram cobiçar mais que uma esposa.
Continuando minha recitação do Alcorão, topei com essas palavras de Allah da mesma Sura 34, Ayah 34:
Os homens têm autoridade sobre as mulheres, pelo que Allah preferiu alguns a outros, e pelo que despendem de suas riquezas. Então, as íntegras são devotas, custódias da honra, na ausência dos maridos, eplo que Allah as custodiou. E àquelas de quem temeis a desobediência, exortai-as, pois, e abandonais-as no leito e batei-lhes. Então, se eles vos obedecem, não busqueis meios de importuná-las. Por certo, Allah é Altíssimo, Grande. [Nasr]
Agora, suponhamos que eu vá pra casa e comece a bater em minha esposa por uma ou outra razão; isso seria um crime; com certeza perturbaria meus filhos e vizinhos. Este Ayah não tem nada a ver comigo; ele é completamente irrelevante!
Agora, como um Muçulmano devoto, continuei minha recitação e parei na Sura 2, Ayah 216, “Al-Baqarah”.
É-vos prescrito o combate, e ele vos é odioso. E, quiçá, odieis algo que vos seja melhor. E, quiçá, ameis algo que vos seja pior. E Allah sabe, e vós não sabeis. [Nasr]
Eu não cresci num contexto militar e nunca me empreitei numa guerra. Como escritor, uso meu cérebro para viver e para dialogar com meus amigos. O único momento em que uso meus músculos é quando carrego minhas malas para viajar. Então, o que realmente quer dizer “É-vos prescrito” para mim?! Como comparo minhas atitudes com o Alcorão, me descobri alienado desses ensinos. Então, eu pergunto: minha alienação diminui meu status como Muçulmano?
E ainda, eu continuei recitando o Alcorão e cheguei à Surah 8, Ayah 41, “Al-Anfal”.
E sabeis que, de tud que espoliardes, a quinta parte será de Allah, e do Mensageiro, e dos parentes deste, e dos órfãos, e dos necessitados, e do filho do caminho, se credes em Allah e no que fizemos descer sobre Nosso servo, no Dia de al Furqan, no dia em que se depararam as duas hostes - eAllah, sobre todas as cousas, é Onipotente - . [Nasr]
Eu parei e abaixei minha cabeça temeroso. Tanto a Lei Internacional quando a Declaração Universal dos Direitos Humanos me proibem de acumular espólios de guerra! Tais capítulos e versos são irrelevantes para mim, ou para outros que estão na mesma situação que eu. Para ser honesto, é muito difícil fazer uma exegese dessa passagem e descobrir como ela pode ser aplicada aqui e agora!
Eu sempre sustentei que sou um Muçulmano. Porém, devo chegar a uma honesta e firme decisão sobre minha relação com o texto sagrado do Islã que é carregado de regras opressivas que não me interessam nada. Minha apreensão é partilhada por milhões de Muçulmano que evitam se expressar abertamente sobre esses pontos.
Numa análise final, o Islã não se salvará se não estudarmos seu desenvolvimento através da história e disconectá-lo de seus textos sagrados. O Islã pertence à Umma; ele sobreviverá através da habilidade da Umma em transcender o texto do Alcorão vendo-o como um documento que exerceu o papel principal no nascimento do Islã, mas que não é um documento normativo para nossos tempos.
Ponto 2
O que, por exemplo, o Alcorão pode adicionar à declaração Internacional dos Direitos Humanos, aos Direitos das Mulheres e das Crianças, aos Tratados pela Preservação do Meio-Ambiente, ao Conceito Moderno da Tolerância, Eleições e Plebiscitos? Percebo que não estamos vivendo no melhor dos mundos. Isso exigiria décadas de trabalho. Mas, minha questão é muito clara: com o que o Alcorão pode contribuir? A questão não é sobre com o que o Alcorão já contribuiu nos séculos passados; de fato, ele teve um importante papel na criação de uma nova visão mundial e seu impacto foi sentido até fora do mundo Muçulmano. Ainda, minha questão permanece: Com o que o texto Alcorânico contribui hoje em dia para o bem-estar da humanidade? Podemos encontrar ordens ou soluções no Alcorão para nossos problemas atuais? Ou deveríamos conceituá-lo como irrelevante para nossos tempos e conceituá-lo simples e unicamente como um guia para a adoração a Allah?
Neste fórum, gostaria de dar continuidade à tese mencionada com a esperança de que os outros membros do fórum possam adicionar seus comentários a essa discussão.
Ponto 3: O Alcorão é o documento pessoal do Profeta
Nós julgamos Allah como a fonte de vida, o criador do mundo e o mestre da história; entendemos o Alcorão como um discurso criado, tal como os Mu'tazilitas[5] ensinaram durante o século IX. Agora, sendo um discurso criado, não se deve inferir que seus ensinos sejam válidos para todos os tempos em todos os lugares. Ao contrário. Cada criatura possui um tempo de vida limitado; e isso se aplica ao Alcorão.
Ao invés de conceituar o Alcorão como uma constituição inalterável sobre a qual a Umma deve basear suas leis, deve-se, na verdade, entender que ele não é nada mais que um documento histórico. Allah o deu a Muhammad como uma ferramenta em seu esforço pela liderança espiritual de um povo conhecido por seu amor e admiração pela retórica Árabe. Em diversas ocasiões, Allah ameaçou esconder e ocultar sua revelação do Profeta por causa de suas más atitudes, tal como na Surah 17, Ayah 86, “Bani Isra’il”:
E, em verdade, se quiséssemos ir-Nos com o que te revelamos, em seguida, não encontrarias, para ti, patrono contra Nós. [Nasr]
A ameaça de Allah de retirar Sua revelação foi feita contra o Profeta, e não contra a Umma. Isso implica que o Alcorão foi um presente especial de Allah a Muhammad e não uma constituição permanente e inalterável para todos os tempos.
Isso nos leva ao Ponto 4
O Alcorão deveria ser considerado como um texto constituinte no sentido de que seu papel ou sua função acabou logo ao nascer de uma nora ordem histórica, a saber, da Umma Islâmica. Assim, encontramos diversos Ayah do Alcorão que são direcionados exclusivamente ao receptor (Muhammad) num momento específico durante o aparecimento da Umma. Diversas das prescrições do Alcorão só têm algo a ver com o Profeta; agora, após ele, elas não podem ser normativas aos Muçulmanos.
Considere, por exemplo, os Ayahs que ordenaram o Profeta a se casar com Zaynab bint Jahsh, a esposa de seu filho adotivo Zeyd. Eles foram inspirados pelo desejo pessoal de Muhammad ou baseados numa sanção divina que dizia respeito apenas a Muhammad. Esses textos do Alcorão não podem ser aplicados a mais ninguém. Surah 33, “al-Ahzab”:
36 E não é admissível a crente algum nem a crente alguma – quando Allah e Seu Mensageiro decretam uma decisão -, que a escolha seja deles, por sua própria decisão. E quem desobedece a Allah e a Seu Mensageiro, com efeito, se descaminhará com evidente descaminho. 37 E lembra-te, Muhammad, de quando disseste a quem Allah agraciou e tu agraciaste: “Retém tua mulher contigo, e teme a Allah”, enquanto escondias em teu âmago o que Allah te estava mostrando, e receavas os homens, enquanto Allah é mais Digno de que O receies. Então, quando Zaid satisfez seu desejo de estar com ela, fizemo-te com ela casar, para que não houvesse, sobre os crentes, constrangimento em relação às mulheres de seus filhos adotivos, quando estes satisfazem seu desejo de estar com elas. E a ordem de Allah deve ser cumprida. [Nasr]
Então, ainda na mesma Surah, Ayah 32, encontramos essas palavras dirigidas exclusivamente às esposas do Profeta, e que são irrelevantes às outras mulheres Muçulmanas.
Ó mulheres do Profeta! A quem de vós cometer obscenidade, duplicar ser-lhe-á o castigo, em redobro. E isso, para Allah, é fácil. [Nasr]
Há certos Ayahs que dizem respeito exclusivamente a não-Muçulmanos, como exemplo Surah 2, Al-Baqarah:
47 Ó filhos de Israel! Lembrai-vos de Minha graça, com que vos agraciei, e de que vos preferi aos mundos. [Nasr]
Tendo feito referência a esses versos do Alcorão que tem aplicações particulares, devemos perguntar: como o Alcorão pode ser um padrão de crença ou uma norma de conduta aplicável a todos os tempos e em todos os lugares? Isso nos leva a outra questão relacionada: O Alcorão tem alguma outra função além de ser um guia de adoração e louvar a Allah?
A “descida” do Alcorão sobre Muhammad (610-632) serviu como selo de aprovação de Allah à missão profética de Muhammad numa cultura que era notória por sua inclinação à retórica. A revelação era para ser recitada como um ato de adoração, segundo a Surah 73 Al-Muzammil:
1 Ó envolto nas vestes! 2 Levanta-te e ora durante a noite, exceto durante um pouco; 3 sua metade, ou diminuir dela um pouco; 4 ou acrescenta-lho. E recita o Alcorão, lenta e claramente. [Nasr]
As antigas Revelações [em Mecca] não tinham relação aos assuntos governamentais, ou a leis, ou arranjos sociais, etc. A função permanente do Alcorão é de fornecer uma ajuda na adoração a Allah. Isso pode ser percebido quando um Muçulmano não-Árabe recita o Alcorão sem entender suas palavras! O texto sagrado (em Árabe) serve como uma parte integral no ritual de oração dos Muçulmanos ao redor do mundo.
Resumindo
Eu sou Muçulmano, tanto emocional quanto culturalmente. De fato, nenhuma pessoa pode estar mais próxima do “espírito” do Islã que esses novos Muçulmanos que declaram que o que os atrai ao Islã é “sua direta e natural relação com Allah.” Eles se sentem assim, libertos dos textos religiosos do Islã e de seus grilhões. Eles se sentem próximos a Allah, esse Ser Supremo, que não vive em nenhum santuário e nem dentro de nenhum texto sagrado e nem em nenhuma religião específica.
Análise
O autor desse ensaio se proclama Muçulmano; mas ele proclama a liberdade de adotar uma nova hermenêutica do Alcorão que o permitirá discordar desses ayahs que estão carregados de normas pesadas e que nada tem a ver com ele. Ele quer “disconectar o Islã de seus textos sacros”. Ele diz que sua apreensão sobre a inaplicabilidade do Alcorão aos dias atuais é compartilhada por milhões de Muçulmanos que hesitam em se expressar abertamente sobre esses assuntos.
Comentários
Quando eu crescia no Oriente, e estudava a história Árabe-Islâmica e sua cultura, eu raramente me fiz uma crítica tão forte e aberta sobre o Alcorão. Eu conhecia o problema de Taha Hussein com as autoridades religiosas de Cairo e o banimento de seu livro para a “Literatura Jahiliyya”. Eu li o “Uma Crítica ao Pensamento Religioso” de Jalal Sadeq al-‘Adhm’ e percebi dentre suas diversas observações críticas, sua perplexidade diante do relato do Alcorão sobre a queda de “Iblis” (Satanás).
Era assim naquele tempo. Mas, agora há a Internet que permite o florescer da liberdade de pensamento. Aqueles que sofreram os efeitos uma severa hegemonia religiosa podem respirar novamente. Agora, há websites dedicados exclusivamente à secularização da civilização Arábico-Islâmica. E aqui esta este corajoso intelectual Marroquino, Sa'eed Nasheed que convida os parceiros de reforma a unirem-se a ele declarando que diversas partes do Alcorão deveriam ser consideradas ultrapassadas. Ele e seus amigos reformadores não podem aceitar as regras Alcorânicas sobre o relacionamento entre homens e mulheres, ou a ordem criar guerras contra os Infiéis, ou os Ayahs que dizem respeito exclusivamente às esposas de Muhammad.
Nasheed resume sua tese declarando sua solidariedade àqueles “Novos Muçulmanos” que estão se libertando dos textos religiosos do Islã e que agora podem se sentir mais próximos de “Allah, esse Ser Supremo, que não vive em nenhum santuário e nem dentro de nenhum texto sagrado e nem em nenhuma religião específica.” Ele afirma não ter perdido sua identidade Muçulmana e cultural e pode, na verdade, definir seu entendimento do Islã como o de alguém que se permite ter uma relação “direta” e “natural” com Allah. Essa declaração em si já é um indicador de uma redefinição do Islã que é totalmente surpreendente. Sua jornada por um relacionamento “direto” com Allah implica que a revelação é desnecessária, e isso é completamente diferente do que os Cristãos mantém sobre a revelação natural (ou geral) e especial de Deus, como ensinado nas Escrituras e confessado nos credos dos séculos XVI e XVII[6]. Mas, se os ensinos da ortodoxia Islâmica permitiriam esse conceito fora de seus estreitos limites, isso já é outra questão. As declarações de Nasheed indicam inclinação ao universalismo, sem fixar Allah a nenhum “santuário”, “texto sacro” ou “religião específica”. Esse conceito de Deus se adequa a pensamentos atuais em muitos círculos ocidentais. Pensamentos de que o indivíduo pode ter uma experiência subjetiva, pessoal e mística com a Divindade, seja lá como ela seja definida. Nem os Cristãos ortodoxos e nem os Muçulmanos ortodoxos podem aceitar essa reformulação como ortodoxa, embora os Cristãos possam admitir que o que ele diz está certo em certos pontos. O problema está com a verdade em si como é aderida por aqueles crentes de qualquer religião. O Cristãos sustentam que a Bíblia seja a única verdade absoluta para fé e prática; os Muçulmanos dizem que o Alcorão é a autoridade. No fim, o que um diz ou pensa sobre Deus/Allah em ambas as religiões acabará estando em harmonia com seus respectivos livros sacros. A diferença, porém, entre o Cristianismo e o Islã diante de alguém que diz ter conceitos pessoais sobre a fé e sobre a interpretação dos livros sacros é que o Cristianismo tolera esses considerados pouco esclarecidos, ignorantes e subversivos da fé, enquanto tenta educar suas deficiências. Já o Islã ainda não aprendeu a graça de tolerar aqueles que se tornar a exceção em seu sistema de crenças.
No geral, alguém se simpatizará com esse pensativo ensaísta, apenas se procurar moderar e até mesmo rejeitar totalmente aspectos toscos de sua ainda amada religião, o Islã. Se o Islã virá a subtrair algo de seus textos autoritativos e desvencilhar-se de seus 1400 anos de teologia e jurisprudência, isso é algo muito duvidoso. Talvez sua ideia pudesse ser menos radical e ele pudesse oferecer uma proposta modesta tal como outros já ofereceram, como declarar como normativas penas as Suras de Mecca. Dessa forma o Islã deixaria de lado todos esses ensinos pesados e severos das Suras de Medina, a maioria dos quais formam as bases da opressiva Lei Sharia. Ele parece estar num profundo mergulho rumo a uma realidade espiritual mais verdadeira. Os textos sagrados são extremamente importantes. Mas, qual deles é o verdadeiro, essa é a discussão entre todas as religiões do mundo. Obrigado, Sa'eed Nasheed por sua contribuição para o avanço do diálogo.
Nota:
Dos sete Ayahs do Alcorão que Nasheed citou neste ensaio, somente duas pertencem à parte Mecana do Alcorão, enquanto cinco Ayahs (que tratam de diversos aspectos da vida social) pertencem aos capítulos de Medina do Alcorão.
Notas Finais
[1] ARABIC THOUGHT IN THE LIBERAL AGE: 1798-1939. De Albert Hourani, Oxford University Press, London & New York, 1970, p. 129. Por gesta Dei, Hourani quis dizer que os Muçulmanos atribuiram seu sucesso antigo a feitos de Allah!
Albert Hourani (1915-1993) nasceu em Manchester, Inglaterra, filho de pais Libaneses que imigraram do sul do Líbano. Estudou na Univerdade de Oxford e depois lecionou brevemente na Univerdade Americana de Beirute. Em 1951 se tornou conferencista Universitário de história moderna do Oriente Próximo e, posteriormente, se tornou diretor do St. Antony’s College Middle East Centre. Para uma lista de seus livros, por favor vá até: http://www.bookfinder.com/author/albert-hourani/
[2] Sadeq al-Adhm foi detino e preso em 8 de janeiro de 1969 e liberto uma semana depois. Foi acusado de atacar publicamente as crenças religiosas tanto de Muçulmanos quanto de Cristãos. Em 27 de maio de 1970 compareceu diante da corte Libanesa e foi exonerado das acusações de instigar dissensão religiosa na sociedade Libanesa.
Essa informação fio extraída da edição de março de 1972 de seu livro. O fato de que o livro apareceu em três edições sucessivas testifica que isso foi possível, desde que antes da Guerra Civil do Líbano (1975), porque publicar um livro crítico contra o Islã em Beirute seria impossível no presente por causa do clima político do Líbano causado após o surgimento do grupo radical Xiita conhecido como Hizb-Allah, o Hesbolá
[3] Nota sobre o artigo autobiográfico de Sa’eed Nasheed postado em 14 de janeiro de 2010
Cerca de 25 anos atrás, Sa’eed estudava filosofia na Universidade de Rabat, no Marrocos. Ele era um ativista dentre os estudantes universitários esquerdistas. Muito freqüentemente ele faltava às aulas, gastando seu tempo no Centro Cultural Soviético, aprendendo Russo e lendo Pravda e outras publicações soviéticas. Ele se tornou meu querido de seu professor de filosofia, Abdel-Salam ben-‘Abdel-‘ali que ensinava seus estudantes sobre como refletir e pensar através sobre os problemas que faceavam sua nação no fim do século. O mundo de Sa’eed quase desmoronou com a queda a URSS, mas, eventualmente, ele pôde ver a fraqueza de todos os regimes e ideologias totalitárias. No entanto, sua paixão pelos escritos russos e sua familiaridade com os filósofos pós-modernos contribuíram para sua perda de fé nas verdades proclamadas pelo Islã. De alguma forma, ele ainda se considera um Muçulmano, mas um Muçulmano que questiona tudo, até mesmo a autoridade do Alcorão, as declarações de Muhammad e até de Allah!
[4] Os Árabes tendem a exagerar quando falam e escrevem. Enquanto “loucura” não faz sentido em nosso idioma, suas palavras poderiam ser parafraseadas, “Na verdade, seria loucura ou impensável para mim ter mais que uma esposa.”
[5] O caso do Mu’tazitas em relação ao pensamento Islâmico foi a assimilação de grande número de ideias e métodos de argumentos Gregos ... Assim, as ideias Gregas introduzidas pelos Mu’tazilitas chegaram a dominar grande porção da teologia Islâmica, em especial a teologia racional ou filosófica. Já que os Mu’tazilitas foram rotulados de hereges pelos Sunitas, suas ideias simplesmente não podiam mais serem assumidas, então apenas exerceram um influência indireta.” (The Formative Period of Islamic Thought por W. Montgomery Watt. Edinburgh University Press, 1973, pgs. 249, 250)
[6] O conceito de revelação no Islã é diferente do ensino Bíblico. O Alcorão ensina que o homem se tornou ignorante sobre a vontade de Deus; assim, tudo o que o homem precisa é de “informação” de Allah; desse modo ele pode praticar o que aprender e chegar ao Paraíso. O conceito Cristão de revelação é de nos informar sobre nossa criação segundo a imagem de Deus, a queda de Adão em pecado e a promessa de salvação, cumprida com a vinda de Jesus Cristo e Sua obra redentora. O Islã ignora o pecado original e não tem conceito algum de relação da revelação com a redenção. Isso é ensinado por Paulo em Romanos e sumarizado pelas confissões Reformadas mencionadas abaixo.
Epístola aos Romanos, Capítulo 1
18 Porque do céu se manifesta a ira de Deus sobre toda a impiedade e injustiça dos homens, que detêm a verdade em injustiça. 19 Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. 20 Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis.
Confissão de Fé de Westminster (1647)
CAPÍTULO 1 - Da Escritura Sagrada
I. Ainda que a luz da natureza e as obras da criação e da providência de tal modo manifestem a bondade, a sabedoria e o poder de Deus, que os homens ficam inescusáveis, contudo não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e da sua vontade necessário para a salvação; por isso foi o Senhor servido, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e malícia de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda. Isto torna indispensável a Escritura Sagrada, tendo cessado aqueles antigos modos de revelar Deus a sua vontade ao seu povo.
A Confissão de Fé Belga (1561)
2. Como conhecemos a Deus
Nós O conhecemos por dois meios. Primeiro: pela criação, manutenção e governo do mundo inteiro, visto que o mundo, perante nossos olhos, é como um livro formoso, em que todas as criaturas, grandes e pequenas, servem de letras que nos fazem contemplar "os atributos invisíveis de Deus", isto é, "o seu eterno poder e a sua divindade", como diz o apóstolo Paulo (Romanos 1:20. Todos estes atributos são suficientes para convencer os homens e torná-los indesculpáveis.
Segundo: Deus se fez conhecer, ainda mais clara e plenamente, por sua sagrada e divina Palavra, isto é, tanto quanto nos é necessário nesta vida, para sua glória e para a salvação dos que Lhe pertencem.
* This article is a translation of "What is the Quran?" - original
* Este artigo é uma tradução de What is the Quran" - original
Voltar para a página principal
Palavras-chave
Mohamed, Maomé, Muhamed, Mohammed, Islã, Islam, Alcorão, Al-Corão, Quran, Korão, Al-Korão, hadith, hadice, sharia, tafsir, islamismo.